domingo, 25 de julho de 2010

GÊNERO E DESIGN

Li há pouco tempo um livro sobre linguagem e design intitulado A LINGUAGEM DAS COISAS, de Deyan Sudjic, no qual o autor mostrava como os profissionais dessa área desenhavam os móveis e objetos em geral pensando nos valores já sedimentados na cultura. Em um dos momentos do livro, o autor menciona como os objetos eram projetados de acordo com o que se convencionou chamar de masculino e feminino. Se pensarmos bem, podemos verificar no nosso entorno, nos espaços que transitamos cotidianamente e nos textos com osquais interagimos o quão gendrados são os objetos. Tomemos como exemplo os perfumes, os desenhos e as fagrâncias . Em geral, atribue-se os cheiros mais adocicados às mulheres e os amadeirados e cítricos ao homens. Com automóveis acontece o mesmo: os carros angulares e maiores são vistos como masculinos enquanto que os menores e arrendodados são vistos como femininos. Apesar disto, a recepção pode ser diferente, escapando às expectaivas e intencionalidades do sujeito que produz. Lembro-me da época que o ford Ka foi lançado, modelo 2003. A propaganda do carro trazia mulheres como público destino e as modelos que posavam não eram aquelas que costumávamos ver nas outras propagandas, como objeto de desejo masculino, assim como era um carro. As mulheres apareciam em uma postura ativa e isso era materializado nos elementos semióticos e verbais. Atitudes corporais - braços, pernas, olhar - buscavam passar a idéia de que aquela mulher estaria no carona, mas iria comprá-lo, dirigi-lo. A beleza do carro era destacado.

Em uma das propagandas um carro de cor preta aparecia próximo a uma modelo também vestida de preto com a seguinte enunciado: “black is beautiful”. Em suma, em se tratando de um produto para mulheres não caberia enfatizar detalhes técnicos, o que certamente estaria estampado no texto publicitário se o veículo fosse projetado para um público masculino. Acontece que o ford ka passou a ser consumido pelo público masculino também já que mesmo sendo um carro com motor 1.0, era leve o que  possibilitava um bom desenvolvimento nas pistas, principalmente em ladeiras, pensando em um aspecto específico de Salvador. Resultado: os homens passaram a ver o ford ka como um carro arrojado, forte, veloz e barato. As mulheres continuaram a apostar no ford ka, mas não sabemos se pela beleza, pelo desenvolvimento ou por ser compacto. O interessante é que o efeito na recepção é imprevisível, mesmo com todas as estratégias de venda, principalmente os textos propagandísticos. Um outro elemento importante é que os produtores pensam, racionalizam a partir dos estereótipos de gênero, buscando por referências já internalizadas pela audiência a fim de facilitar a adesão e aceitação.

Um outro exemplo muito interessante que pode ilustrar o debate de gênero enquanto arcabouço teórico diz respeito a uma peça publicitária de uma loja de móveis para escritórios. O nome da loja é Maxi Móveis e o propósito do texto é informar, divulgar a liquidação de móveis para escritórios. O que me chamou a atenção foi a imagem localizada no lado esquerdo do texto: duas cadeiras uma na cor azul e a outra na cor rosa. Na azul estava escrito “conforto” e na azul “beleza”. Temos conhecimento que os produtores trabalharam com referências simbólicas já existentes – azul/homem e rosa/mulher e para completar ratifica o imaginário de que as mulheres estariam interessadas na beleza e os homens no conforto. Tendo em vista que uma cadeira é para ser usada no escritório e que precisa estar em condições para suportar o corpo para que ele possa trabalhar melhor, caberia pensar se o conforto não seria mais importante para o desenvolvimento de uma tarefa profissional do que a beleza ou ainda, para sair do binarismo, se ambos não seriam importantes para o desenvolvimento do trabalho. Poderíamos ainda perguntar o motivo pelo qual esta blogueira elegeu o conforto como principal item e porque este item estaria vinculado ao homem, simbolizado pela cor azul, passando assim a valorizar os elementos que estariam associados ao seu sexo.

De qualquer sorte, valeria acompanhar como as linhas e formas também dizem coisas sobre o seu conteúdo, sobre a ideologia de um grupo.