segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

UMA QUESTÃO DE DISCURSO: MÍDIA, GÊNERO, AMOR, POLÍTICA...

Se pensarmos no imaginário sedimentado pelos discursos veiculados pela mídia e as artes verificaremos que hegemonicamente a representação de mulheres que aspiram por um grande amor lastreia as narrativas elaboradas e disseminadas através dos vários e diferentes suportes através dos quais a linguagem se materializa. Pensemos nas peças publicitárias, nas telenovelas, nos filmes comerciais, nas letras de música, nas falas cotidianas que atualizam ditos populares eivados de preconceito, enfim, em todas as formas textualizadas que nos chegam aos olhos e nos fazem interagir com o mundo.

Sem dúvida, teremos muitos contrapontos, mas predominam certas normatizações muitas vezes camufladas de valores que consideramos positivos, daí a grande dificuldade de tratarmos criticamente certos enunciados, pois tendemos a apreender o conjunto, a totalidade, o universal. Nesse caso, um trabalho de catar feijão (como não catamos mais…), retirando as impurezas para selecionar os melhores grãos fosse necessário para lembrarmos que no discurso acontece o mesmo.

Devemos analisar o texto, identificando a estratégia e recurso usados para esconder a ideologia, o propósito, em geral hostil ao interlocutor e, por isso, velado para ele. Lembro-me de uma expressão de Noam Chomsky: consentir sem consentir, isto é, como concordar com algo que não concordamos. Podemos fazer isso violentamente e sem violência, de forma sedutora. Esta forma é a mais perniciosa, pois sendo sutil leva a uma adequação das partes, fazendo crer que houve uma vontade mútua, um contrato, mas só aparente. Por isso, digo sempre que uma mulher pode declarar aos quatro ventos que gosta de apanhar, pois eu vou dizer que ela não gosta. Apenas aprendeu a consentir sem consentir. Devemos, a meu ver, valorizar mais os estudos das linguagens, pois elas, de fato, são responsáveis pela adesão das pessoas a qualquer projeto político, pensando a política como um movimento não apenas público, externo, mas como gestos da cotidianidade, onde o público e o privado se inteseccionam.

Em a Arte de Amar, de Ovídio, podemos igualmente aplicar suas orientações à arte de fazer política, pois no amor a política assume a sua forma mais íntima e perversa. Não é à toa que Ovídio insiste na idéia da promessa como estratégia para manter o amante subjugado, pois a promessa alimenta a esperança, que por sua vez mantém o outro preso, pois dele depende para obter o objeto de desejo. As promessas políticas valem-se do mesmo princípio, pois o realizável, o desejado é um devir e é com base na esperança – de mudança, do novo, de melhores condições, de mais emprego, saúde, eucação, segurança – que muitos são embalados ao som de jingles apelativos, imagens persuasivas e uma arquitetura retórica engenhosamente elaborada para uma adesão uniformizada.

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